há ou não há?

Há ou não há?

 

Há ou não há

um vestígio de

eternidade no mar?

Há ou não há

Uns laivos de

Esperança na dor?

Há ou não há

Um pequeno

Cato verde no deserto?

Há ou não há

Um subtil

Milagre quando

Alguém nasce?

Há ou não há

Azul vindouro

No céu cinzento?

Há ou não há

Um sentido positivo

Para as misérias

Da história?

Há ou não há

Um traço de mistério

Nos bastidores da ciência.

Há ou não há

Um coração

Que bombeia

A mente não linear?

Há ou não há

Um caminho estreito

Na minha escuridão?

Há ou não há?…

 

Coimbra, 12 de Abril 2004

JP in Poemas 16 Julho, 2020

Liberdade

Liberdade

 

Rubicão da liberdade

é sacudir a circunstância.

Intrincar-se na ponte

entre a soledade

(que mora dentro de mim)

e a jornada que vivo.

Uma e outra,

a essência interior

e a realidade oferecida,

são dádivas garantidas.

2018

 

JP in Espiritualidade Poemas 22 Junho, 2020

tempo

O tempo

 

O tempo é também

quase capicua

que avança e recua…

Mas passa, o tempo.

E não há maior segredo

do que o agarrar

vivendo bem

cada momento

mesmo de dificuldade

sofrimento ou morte.

Porque sopra um

paradoxal vento

de instante e eternidade.

O tempo é lento

e saboroso,

mas corre…

 

14-03-2012

JP in Poemas 22 Maio, 2020

fazendo-me

Fazendo-me…

Sou um Homem

a fazer-se,

uma bilha em enchimento.

Sou um processo

em aberto,

ventoinha em movimento.

sou um livro

que se abre.

Sou escutante

de um recado.

Sou errante

procurante,

quando páro,

sou buscado.

Sou vivente

agradecido.

Sou morrente

renascido.

JP in Poemas 6 Maio, 2020

vergo-me

Vergo-me

 

Vergo-me

em silêncio

face

ao espectáculo

da dor.

Tiro sandálias

engulo sílabas

verto lágrimas

… e páro!

Fico,

em silêncio,

cravado

onde estou.

Todo inteiro,

agarrado.

Abraço

aquele tempo,

tão instante

quanto eterno

… e permaneço,

vergado,

… em silêncio!

 

28 de Janeiro de 2011

JP in Espiritualidade Poemas 22 Abril, 2020

Terra assumida

Terra assumida

O Céu que quer

desabrochar em nós

exige Terra assumida:

árida e fecunda,

ampla e de grãos,

livre e pisada.

É a Terra que somos…

JP in Poemas 22 Março, 2020

moribundisse

Moribundisse

 

Na moribundisse

desse instante

…longo instante…

se radicaliza

a angústia,

a esperança,

a dúvida e

a certeza.

Ali se joga

em escala

intensa,

em alto grau,

em câmara lenta

rápida

o que a vida

teceu

no tempo.

…Desde o útero

desde o ventre

do cosmos.

Fornos, 4 de dezembro de 2017

JP in Espiritualidade Poemas 6 Março, 2020

último segredo

Último segredo

 

Meu último segredo

é este deserto

este trabalho

este suor

de procura.

Disfarço

convicções fortes

mas são ténues

as formas

de um duro

esculpir.

Só vagamente

uma nesga de Sol

aquece

mares duvidosos.

Mas saboreio

uma laranja

na sombra da árvore

depois da horta

amanhada.

Esse gomo

me salva!

 

Fornos, 2019

JP in Poemas 24 Fevereiro, 2020

homenagens

Homenagens

 

 

Prescindo

hoje e amanhã

(mesmo em cinzas)

de uma qual-quer(?)

homenagem.

Prefiro a memória

Simples e discreta

De um qual-quer(?)

Rasto de amor.

Custa-me ver a fila

(a logística, a mobilização)

para saudar uma honra.

Use-se tal energia

Para abraçar alguém,

Para amparar

Uma qual-quer(?)

pessoa frágil.

Acresce ainda

Que nada mereço.

E a haver uma honra

Seja endereçada

À graça de Deus

Que, por graça também,

Me usou (quando eu deixei)

para se espelhar.

 

2018

JP in Poemas 14 Fevereiro, 2020

Ciência ou poesia

Ciência ou poesia?

 

Entre focos de prazer:

ciência ou poesia,

pergunto, o que fazia

se tivesse de escolher.

Ciência e poesia…

acho que me apetecia

fazer desta maneira:

as duas na algibeira!

A ciência escolheria

Se quisesse mais rigor,

com saber eu saberia

como cresce uma flor.

E olhando essa flor

a colhesse com alegria

e oferecesse em amor,

embrulhava em poesia…

Se em vez de perceber

eu quisesse antes dizer

o que a fórmula não diria,

escolheria então a poesia…

Não vou escolher, mas juntar

Trago ciência e poesia.

Ciência é luz a brilhar,

poesia é luz no meu dia.

in Paiva, J. C., Quase poesia quase química (2012) (e-book). Lisboa, Sociedade Portuguesa de Química.

acessível aqui (porventura enriquecido com uma ilustração)

 

JP in Ciência Poemas 30 Janeiro, 2020