afirmação cristã

Há uma tensão entre a afirmação identitária de uma crença, como a cristã, e a abertura sem limites a uma verdade ainda mais ampla. O meu sublinhado, porventura também com alguma irreverência, é se não somos mais Igreja por esta via (vou chamar-lhe via larga…) do que por qualquer outra defensividade afirmativa, militante e eclesialmente ‘auto-centrada’…

JP in Sem categoria 6 Julho, 2023

teólogos da segurança…

Os teólogos da segurança ficam arrepiados com as aproximações ecuménicas menos diferenciativas, assustados com o ‘tanto faz’ das religiões. Sim, há diferença nos caminhos espirituais da humanidade, mas, por submissão positiva à bondade universal e amorosa de Deus, há uma relativização da via religiosa-espiritual, que redunda quase nisso: salvação no trilho da boa vontade vertida nas possibilidade de cada pessoa e de cada cultura, um ‘quase-tanto-faz’, sim… (para positivamente escandalizar tal teologia securitária…)

JP in Sem categoria 26 Janeiro, 2023

fé aberta…

O teólogo Balthasar tem uma expressão-síntese, tão simples quanto fulcral, tão cristã quanto universal: “Deus espera por todos”. Esta confiança pode ser mote existencial de vida e alimenta uma esperança comum e radicalmente aberta.

JP in Sem categoria 20 Janeiro, 2023

outros carismas

Sobre outros carismas e espiritualidades, eis a colocação mais libertadora: “com outras linguagens, tendem à mesma procura!”

JP in Espiritualidade Frases 30 Novembro, 2021

religiões

Sobre religiões comparadas (exluindo o sociologicamente patológico) podemos avançar, no máximo, em ‘bom versus melhor’, com a humildade radical de quem sabe que não há luzes sem sombras nem sombras sem luzes no tatear do mistério.

JP in Educação Espiritualidade Frases 28 Julho, 2021

Empanturrados de religião

Paiva, J. C. (2021). Empanturrados de religião. Site Ponto SJ, 24-1-2021.

Disponível aqui

Tropecei algures, não sei onde, com uma expressão feliz de crítica religiosa: “os empanturrados”. Olhando à minha volta e até na minha história pessoal, dentro da Igreja, reconheço com nitidez estas insinuações.

A dose, a intensidade e a colocação da “coisa religiosa” merece constante resignificação na vida de cada crente. Sem uma lucidez crítica apurada, facilmente caímos em dois lugares extremos que representam, ambos, um não encontro: ou nos desiludimos, ou nos empanturramos.

Convoco duas analogias que me foram trazidas pelo jesuíta Javier Melloni, não sei se em segunda, se em primeira mão, para explicitar a minha colocação: a analogia do copo e do vinho e a analogia do caminho e do veículo.

O copo e o vinho. Segundo esta analogia, o essencial espiritual representa o vinho. Note-se que o vinho é bom, perfumado, saboroso, valioso e dom (fruto do trabalho, também…). As religiões seriam o copo, por onde se pode tomar o vinho, com valor adicional de eficácia. Os copos, porém, valem pelo potencial de conter e partilhar o vinho, não por si. São diversos nas formas, feitios, cores, mas apresentam uma função em si própria louvável, que é a de serem disponbilizadores de vinho. Há uma certeza humilde que o copo deveria ter (perdoe-se-me a personificação): o copo não é nem a fonte nem o vinho!

O caminho e o veículo. Nesta analogia, o caminho, desde logo comum e não exclusivo de ninguém, é o trilho onde se pode progredir. Este caminho é feito de estações de encontro e constitui, em si mesmo, também teleologicamente, o Encontro. O veículo, mais uma vez com potencias de utilidade e favorecimento, ajuda a caminhar. As religiões, bem entendido, são veículo e não são caminho, não lhes cabendo, portanto, qualquer espaço nem tribal nem endogâmico. Se convém cuidar do veículo? Sim, fazer as revisões, estimar e não estragar desnecessariamente. Mudar o óleo, evitar a corrosão. Mas que se cuide do veículo para ele andar e, já agora, de forma inclusiva, para ser o veículo do nós e não o meu veículo. Todos conhecemos os endeusadores de automóveis, às vezes de coleção: estão polidos, expostos e protegidos… mas progridem pouco, valendo mais para serem vistos do que para caminhar. Há também carros que optaram por se preservar das agressões externas, quiseram ser defendidos e resguardados. Ficaram parados, não fazem caminho e mais parecem sucata…

Ambos os cenários analógicos, como se vê, apresentam forte potencial ecuménico e inter-religioso mas são, simultaneamente, as estradas da própria identidade cristã, cuja marca tem em si própria a porosidade radical de quem não tem fronteiras. Quem coloca o tónus no copo escolhe lutar pela sua posse, enquanto o vinho é diálogo. Quem se polariza no veículo foca-se em defender(-se), enquanto o caminho é rasgada oferta.

Na linguagem analógica acima podemos perceber bem os dois extremos típicos já aludidos: os que com alguma ingenuidade optam por aceder ao vinho sem copo ou que caminham sem veículo (concedendo-se que algum vinho beberão e alguns passos andarão); e os que, em reduto fundamentalista, que não é nem fundamental nem radical, endeusam os copos e esquecem o vinho, puxam o lustro ao veículo, mas mantem-no estático.

O cerne do equívoco prende-se com a clarificação do que é central e do que é periférico. Com alguma clareza, observo na lide religiosa quem toma como central as formas, as normas, as roupagens e as exterioridades. Essa (pesudo)segurança fecha, enrijece e, não raras vezes, é bafienta a até apodrece. Se, pelo contrário, o centro for a fé, a crença vivida num Deus que só ama e cria e a misericórdia com que, também por nós, se verte no mundo, resulta em abertura, respiro, leveza… vinho e caminho.

O contrário do indesejável moralismo não é a amoralidade. Os que trabalham para se centrar e recentrar atenta e comunitariamente no núcleo amoroso da fé não desprezam as roupas com que nos precisamos de vestir, mas estão conscientes da secundariedade das formas, dos ritos e dos normativos. Estes só servem se colorirem o fundamento primeiro do amor a Deus e ao próximo. Jesus de Nazaré parece ser, a este nível, inspirador…

Perguntei-me, por simetria, se haveria “empanturrados de Deus”. A minha conclusão é que Deus não deixa que d’Ele nos empanturremos. Há um lado na relação com a transcendência que é da ordem do “quanto mais melhor”. Mas esse salto místico, paradoxalmente, deixa-nos sempre não possuidores e, pelo contrário, expostos com entusiasmo à novidade e à alegria interior, com as suas consequências relacionais soltas e promotoras. Mais ainda, essa overdose com o Totalmente Outro, dentro de nós e em toda a parte, alimenta-se da não palavra, num silêncio que não ocupa espaço de sobrelotação. A nossa religiosidade, portanto, ou serve essa mística aberta vivida… ou empanturra…

JP in Sem categoria 26 Janeiro, 2021

Eles deixaram logo as redes e seguiram Jesus

Na liturgia católica romana deste fim de semana escuta-se Mc 1, 14-20

Eles deixaram logo as redes e seguiram Jesus

No final da semana de oração pela unidade dos Cristãos, celebramos este caminho de unidade dos que seguem Jesus, para além das suas pertenças religiosas. Como os pescadores que deixaram as redes (que os prendiam…) podemos perguntar-nos que redes nos prendem, na vida quotidiana. Que liberdades, interiores e exteriores, esperam por seguimentos libertadores? Em particular, será a nossa pertença religiosa (se fechada, fundamentalista ou sectária) uma rede que prende?…

JP in Espiritualidade 24 Janeiro, 2021

Mulher, é grande a tua fé

Na liturgia católica romana deste fim de semana escuta-se Mt 15, 21-28

A mulher a quem Jesus dirige as palavras «é grande a tua fé: faça-
se como desejas», é uma mulher gentia, exterior ao povo judeu. Depois de insistir para que Jesus a visse e atendesse, ela vê confirmada a sua aposta no Mestre e é atendida pela Sua misericórdia. Se dúvidas houvesse sobre a porosidade dos que podem aceder a Jesus, este texto do Evangelho recoloca-nos na radical abertura. Fora da esfera formal e institucional da Igreja, como sabemos e vemos, há muita fé! Esta passagem pode ajudar-nos a abrir horizontes e vistas, reprimindo qualquer fundamentalismo religioso. É muito saudável perceber que pode haver salvação (fé, verdade, vida, felicidade, encontro…), fora da tradição de qualquer religião. Dito de outra forma: toda a fé, toda a verdade e toda a vida autêntica, com ou sem rótulo, coerente com o amor, é de Deus.

JP in Espiritualidade 16 Agosto, 2020

eis o Cordeiro de Deus

Na liturgia católica romana deste fim de semana escuta-se Jo 1, 29-34

«eis o Cordeiro de Deus»

 

A expressão “eis o cordeiro de Deus” é atribuída a João Batista, o dizente de Jesus. Os Judeus tinham o hábito de matar um cordeiro como expressão sacrificial a Deus. Jesus como cordeiro, convoca continuamente as raízes judaicas mas apresenta algumas descontinuidades relevantes: não precisamos mais de sacrifícios de animais para agradar a Deus (o próprio Cristo simboliza essa entrega) e o sacrifício que importa para Deus é o amor que a vida de Jesus testemunha. “Cordeiro de Deus” é uma frase frequente na eucaristia e aponta para celebrar a mais nobre e inspiradora entrega, aquela de morrer por amor. Em semana de particular intensidade para a unidade dos Cristãos, une-nos esta essencialidade à volta da entrega de Cristo, que nos pode tornar precisamente seguidores de Cristo, precisamente cristãos…

JP in Espiritualidade Frases 18 Janeiro, 2020

três movimentos do diálogo

Os dia-logos com o outro, no âmbito religioso, cultural e até em relações humanas entende-se bem numa viagem de três momentos: 1- a minha casa (reconhecer-me, percecionar-me, conhecer-me internamente); 2- saída de casa (para acolher o alter diferente, que me pode completar e fazer crescer); 3- regresso a casa (diferente, tonificado pelo diálogo, enriquecido…).

JP in Educação Espiritualidade Frases 26 Dezembro, 2019