Morrer
Não fomos feitos para não sofrer nem para não morrer, mas para dar a vida.
Não fomos feitos para não sofrer nem para não morrer, mas para dar a vida.
Na liturgia católica romana deste fim de semana escuta-se Mt 22, 15-21
As perguntas difíceis a Jesus, tipicamente engendradas em chave de cilada, são as perguntas difíceis da nossa vida. Tocam as zonas nevrálgicas da existência. No caso presente, a relação com a posse. Na cena apontada pelo Evangelho estamos diante da posse (e do poder que tal representa) do dinheiro. Mas a extrapolação para outras posses é muito possível: posse de mérito, posse de posições, posse dos outros, posse de estatutos. Dar a César o que é de César (e a Deus o que é de Deus) é relevar a contingência de ter, seja o que for. Talvez se perceba melhor, a partir daqui, que amar é abrir mão, que amar é largar…
Na liturgia católica romana deste fim de semana escuta-se Mt 22, 1-14
Uma reflexão que podemos fazer, a partir desta parábola, é esta: “que convidado sou”? Certamente cada um de nós é um pouco dos dois estilos: ora ingrato, não aproveita os convites para o banquete, desperdiçando graça e aventura, ora, por outro lado, não sendo digno de convite, lança-se e aceita o convite do Senhor, desfrutando da abundância. Cientes de que somos convidados mais por graça de quem nos convida e nos pesca na encruzilhada da vida, do que pelos nossos méritos, vamos ao banquete do Senhor. O ambiente da festa é a abertura ao encontro e a fecundidade que brota… E não esqueçamos o traje nupcial, que é precisamente a caridade…
Não datará apenas da Reforma a tensão entre a Salvação, as obras e a Graça. Em tempos de reconciliação cristã podemos acordar numa tomada de conta que nos sacode do fito do mérito e nos abre à consciência humilde da Graça: salvamo-nos porque Deus é Bom!
Na liturgia católica romana deste fim de semana escuta-se Slm 79
“Mostrai-nos, Senhor, o Vosso rosto”, cantamos no refrão do Salmo. Conhecer o rosto de alguém é condição para uma relação, para uma entrega, para um compromisso de amor. O rosto de Deus é, para nós cristãos, o rosto de Jesus. A imagem de Jesus que nos é transportada pela História, pela tradição, pela arte, ou até pelos filmes que recriam a Sua vida pode não corresponder fielmente à realidade. Há traços, contudo, que convém ter presentes: o rosto da misericórdia, o rosto da tolerância, o rosto da paz, o rosto do incentivo para recomeçar, o rosto do abraço. O rosto que não impede o atrito na liberdade mas é promessa de companhia. Estes traços do rosto do nosso Deus deverão ser observados por nós e evitar visões faciais que Deus não tem, como a do medo, a da imposição ou a da austeridade inconsequente.
Há um poema de Khalil Gibran bastante conhecido, intitulado “pegadas na areia”. No remate da história, Deus leva-nos ao colo. Tenho algumas cócegas na areia… É que vejo e experimento mais Deus a acompanhar-me no deserto do que a levar-me ao colo…
Na liturgia católica romana deste fim de semana escuta-se Mt 21, 28-32
Mas ele respondeu-lhe: ‘Não quero’. Depois, porém, arrependeu-se e foi
Há muitos de nós, há partes de nós (…), que dizem que fazem e não fazem. Outras vezes, pelo contrário, dizemos que não fazemos e fazemos… As palavras do Evangelho, em formato parabólico, valorizam mais o fazer do que o anúncio, mais o gesto do que a palavra, mais a ação do que a intenção. De outra forma, podemos ainda apontar para evitar as justificações palavreadas, substituindo-as por um agir silencioso e coerente. Esta valorização da ação remete-nos pois, também, para o valor da contenção verbal, para o concurso de mais silêncio consolador…
Muitas vezes me perguntam “para quê meter Deus na equação”, pois que a Humanidade e pela Humanidade, bastaria. Compreendo o dilema, que também partilho. Mas algo me atrai, na conceção, no desafio e na vivibilidade, para me inscrever num sonho maior. Mais ainda, tal sonho, também mas não só meu, contempla toda a humanidade… e muito mais.
Uma das tensões pessoais mais complexas é o confronto das muitas solicitações com a nossa ‘não super-humanidade’. Alguns ingredientes: saber dizer não mas aventurar-se, preservar-se mas expôr-se, descansar mas entregar-se, cuidar-se mas não se autocentrar…