pois não sabemos como orar…

Na liturgia católica romana deste fim de semana escuta-se Rom 8, 26-27

Da carta aos Romanos fixamo-nos nesta constatação antiga, da dificuldade em rezar… De facto, se orar (ou rezar) for entendido como descansar em Deus, até aí é difícil rezar. Temos dificuldade em descansar, em geral… e em descansar em Deus, em particular. Daqui decorre que a primeira coisa para (tentar) rezar é, precisamente parar. Diz a mesma carta aos Romanos que o Espírito virá e essa é a promessa que alicerça a nossa fé. Mas para o Espírito nos alcançar, há que não fugir correndo…

JP in Espiritualidade 18 Julho, 2020

ainda morte…

A fuga para a frente pode não ser a chave da boa morte. A (pseudo) fuga mais libertadora é precisamente a receção da vida como uma Graça, uma dádiva, uma promessa de que a fragilidade é a penúltima experiência. A isto se chama Fé.

JP in Espiritualidade Frases 14 Julho, 2020

interpretação da Bíblia e Igreja

O Concílio de Trento, iniciado em 1545, reafirmou a autoridade da Igreja Católica na interpretação da Bíblia, mas o texto do decreto conciliar é bastante genérico e até mesmo ambíguo. Os padres conciliares decretaram que ninguém se deveria permitir «interpretar a Sagrada Escritura, nas matérias de fé e de moral, que pertencem ao edifício da doutrina cristã, distorcendo a Sagrada Escritura segundo o seu modo de pensar, contrário ao sentido que a santa mãe Igreja determina». O texto conciliar não especificou, porém, critérios suficientemente precisos para a definição, por exemplo, de uma questão como sendo de fé ou de moral, nem entrou em pormenores sobre o difícil problema de decidir quando se deveria interpretar a Escritura em sentido literal ou em sentido metafórico.

Desde a tradição medieval que é comum distinguir quatro sentidos possíveis no texto bíblico, a saber: 1) histórico ou literal, 2) alegórico ou cristológico, 3) tropológico ou moral e antropológico, e, finalmente, 4) anagógico ou escatológico.

A tradição hermenêutica é, pois, bem longínqua na história da Igreja. Conhecem-se dois extremos caricaturais, em traços deixados ao longo do tempo e ainda hoje presentes: de um lado, uma visão restritiva e estaticamente ortodoxa da autoridade da Igreja na interpretação bíblica e, do outro lado, uma personificação originalista, que não tem em conta a riqueza da tradição, nem a procura duma expressão comunitária de afirmar dinamicamente as verdades da fé. Caminhamos, ainda hoje, nesta tensão…

JP in Espiritualidade Frases 10 Julho, 2020

luz e esperança

Às vezes caminhamos no deserto e falta-nos luz… Mais do que a luzita, talvez importe a graça do desejo de querer ver. Aquela (a luzita) pode apagar-se, mas esta (a esperança), pode ter chama abundante…

JP in Espiritualidade Frases 6 Julho, 2020

…revelastes aos mais pequeninos

Na liturgia católica romana deste fim de semana escuta-se Mt 11, 25-30

Não convém confundir esta passagem evangélica com um convite à ignorância, ao simplismo ou à superficialidade. Mas há um sentido evangélico que nos alinha em ser “pequeninos”. Evitar ser (ou melhor, achar-se…) “sábio e inteligente” é evitar só contar connosco próprios, prescindindo de Deus e dos outros. Somos “sábios e inteligentes” quando achamos que só nós é que sabemos e não acolhemos humildemente cada pessoa, com os seus limites e riquezas. Ser “pequenino”, à maneira do Evangelho, é ser pobre e, portanto, aberto à novidade de nós mesmos, de cada um (outro) e do cosmos.

JP in Espiritualidade Sem categoria 4 Julho, 2020

quem ama o filho ou a filha mais do que a Mim não é digno de Mim

Na liturgia católica romana deste fim de semana escuta-se Mt 10, 37-42

«Quem ama o filho ou a filha mais do que a Mim não é digno de Mim»

 

Principalmente para quem tem filhos ou filhas as palavras do Evangelho podem parecer chocantes. De facto, é difícil imaginar que se possa amar algo mais do que um filho. Pelos filhos, realmente, dão-se noites, dá-se o corpo, dá-se tudo, dá-se a vida! Jesus pede-nos para O amarmos mais ainda. Ele “usa” a realidade do amor paternal e do amor maternal para colocar a fasquia da entrega a Ele próprio. A entrega a Deus nunca poderia ser um holocausto de diminuição. O apontamento cristão será sempre do tipo ‘quanto mais humano, mais cristão, quanto mais cristão, mais humano’. Há uma coerência humanizante, pois, nesta (difícil e exigente) proposta: é que amando assim a pessoa de Jesus e inquietantemente repousado nos seus critérios e no seu horizonte de liberdade, ama-se mais e melhor, de facto, os filhos e as filhas…

JP in Espiritualidade Frases 28 Junho, 2020

ecologia social

Na sua encíclica Laudato Si, o Papa Francisco convoca-nos para uma ecologia definitivamente diferente, pessoal, global, espiritual e social. Em particular, mais do que gestos verdes (embora também), que podem até ser egocêntricos, está em causa a promoção da justiça e o cuidado dos descartáveis do nosso tempo.

 

 

JP in Espiritualidade Frases 26 Junho, 2020

Liberdade

Liberdade

 

Rubicão da liberdade

é sacudir a circunstância.

Intrincar-se na ponte

entre a soledade

(que mora dentro de mim)

e a jornada que vivo.

Uma e outra,

a essência interior

e a realidade oferecida,

são dádivas garantidas.

2018

 

JP in Espiritualidade Poemas 22 Junho, 2020

esta pobre viúva deitou na caixa mais do que todos os outros

Na liturgia católica romana deste fim de semana escuta-se Lc 2, 41-51

«Esta pobre viúva deitou na caixa mais do que todos os outros»

 

Sabemos da nossa catequese que os critérios de Deus são diferentes dos critérios do mundo. Na nossa vida, porém, custa muito a aprender, interiorizar e viver esta mesma diferença. O que significa, aos olhos do mundo de hoje, a palavra “mais”? Algo de semelhante aos escribas de que Jesus fala no Evangelho: mais dinheiro, mais ostentação, mais poder, mais corpo, mais saúde, mais honras. Seria bom que lêssemos repetidamente esta passagem de Marcos e perguntássemos a nós próprios o que resta em nós de “estilo escriba”. Confrontemos este critério de “mais” dos homens, com aquilo que é “mais” para Deus. É libertador acreditar mas principalmente viver a ideia de que conseguimos despojarmo-nos e oferecermo-nos, tanto mais quanto nos aproximamos de dar tudo o que possuímos.

JP in Espiritualidade Frases 20 Junho, 2020

Ele nos fez, a Ele pertencemos

Na liturgia católica romana deste fim de semana escuta-se Slm 99, 2-5

«Ele nos fez, a Ele pertencemos»

 

Lemos no salmo 99 um verso forte: “Ele nos fez, a Ele pertencemos”. Aderir a este verso pressupõe um golpe de Fé, o de fazer corresponder à pergunta/desejo “eu, embora carente, existo” com uma aposta do tipo “fui e sou criado”. Esta frase tem, pelo menos, duas focagens possíveis: uma diz respeito a nós próprios, à nossa consciência de que somos “barro nas mãos do oleiro”, que somos seu templo e, portanto, nos devemos respeitar e cuidar, no corpo e no espírito, como tal. A outra implicação, não menos importante, é que este salmo é universal e, assim, todos os nossos irmãos são de Deus e a Ele pertencem. Filhos, cônjuges, familiares e amigos, bem como os mais distantes e até os “nossos inimigos”, pertencem a Deus. E se os outros não me pertencem, eu não os posso manipular como um joguete!…

JP in Espiritualidade 14 Junho, 2020