mudita

Há um termo budista que é de si só inspirador: mudita. Significa encontrar a própria alegria na alegria dos outros. Bela agenda…

JP in Frases 4 Novembro, 2021

Isto já não é o que era…

Há um conflito geracional intrínseco, cuja constatação nos devia impedir, à priori, de sermos pessimistas faces à juventude. Uma expressão interessantíssima, que delicia os velhos do Restelo, nos elucida: «A nossa juventude ama o luxo, é mal-educada, zomba da autoridade e não tem nenhuma espécie de respeito pelos mais velhos. As crianças de hoje são tiranas. Não se levantam quando um ancião entra na sala, respondem aos seus pais e são simplesmente más». A curiosidade, porém, é estas palavras terem sido proferidas pelo filósofo Sócrates, há cerca de vinte e quatro séculos…

JP in Educação Frases 2 Novembro, 2021

«amarás o Senhor teu Deus. Amarás o teu próximo» 

Na liturgia católica romana deste fim de semana escuta-se Mc 12, 28b-34
«Amarás o Senhor teu Deus. Amarás o teu próximo»

Os mandamentos do amor a Deus e ao Homens são o cerne da fé judaico-cristã e são invocados com frequência como o terreno firme da religião. Pela negativa, dir-se-ia que a religião se afasta tanto mais do seu trilho quanto mais secundariza este ideário. Destacam-se dois amores (canções de Marco Paulo à parte…): a Deus e ao próximo. Mas podemos focar-nos num ‘terceiro amor’, implícito nesta passagem, sem o qual não há eficácia amorosa: o amor a si mesmo. A intenção seria amar o outro como a mim mesmo. Portanto, sem nos amarmos a nós mesmos, não poderemos amar a Deus e aos irmãos. Temos aqui algum lastro da autoestima, do conhecer-se (e aceitar-se) a si mesmo. Não é narcisismo porque tem finalidade mais ampla, sempre fora de mim, mas contando comigo e com o abraço de acolhimento e validação que consigo dar a mim mesmo… este abraço dado, reconhece-se oferecido … e a isto os crentes chamam Graça.

JP in Espiritualidade Textos 30 Outubro, 2021

Graça

O tempo que nos é dado, agora para teclar, imaginar e criar a saudade do futuro, é, desde logo, uma enorme Graça.

JP in Espiritualidade Frases 28 Outubro, 2021

alquimia e ciência contemporânea

Poderá ser um tanto precipitada a satirização básica da procura da eternidade por parte dos alquimistas. É certo que a clarificação da ciência e da sua metodologia não abrem espaço razoável para qualquer alquimia contemporânea. A tentativa de substancializar a eternidade é uma confusão metodológica em si própria. Mas é curioso notar que, em última instância, particularmente por via da biologia, das neurociências, da farmacologia e da medicina, a ciência continua a ter, em certo sentido, uma agenda de evitamento da morte… As biomáquinas e as associações bionanotecnológicas para perpetuação/substituição de órgãos humanos deteriorados leva-nos à noção de ‘amortalidade’ , com toda a sua conflitualidade tensional ética. Uma certa alquimia do século XXI, convenhamos…

JP in Ciência Frases 26 Outubro, 2021

«grandes maravilhas fez por nós o Senhor»

Na liturgia católica romana deste fim de semana escuta-se o Salmo 125

«Grandes maravilhas fez por nós o Senhor»

Ter fé, de alguma forma, é apoiar-se vivencialmente na ideia de que o amor é a última palavra e, portanto, Deus fez (e faz) maravilhas. O Salmo 125 coloca-nos num dinamismo que diz respeito à nossa vida: o salmista fala nos homens (nós) que “à ida vão a chorar” mas “à volta vêm a cantar”. Saber que o regresso é de júbilo torna possível e até animada uma partida sombria. Ter futuro, ter esperança no Senhor, ter certeza no cantar, suporta o nosso presente e ampara a nossa dor. Este processo repete-se em pequenos e grandes ciclos da nossa vida e, às tantas, o futuro e o presente confundem-se: chora-se cantando e vive-se a esperança. Andará por estes critérios a fé, a própria bem-aventurança da vida…

JP in Espiritualidade Textos 24 Outubro, 2021

pressa e atenção…

Tropecei numa máxima que me pode ajudar muito, apressado que sou. Diz: “o apressado como crú”…

JP in Frases 22 Outubro, 2021

Sacerdócio feminino e paciência eclesial

Paiva, J. C. (2021). Sacerdócio feminino e paciência eclesial. Site Ponto SJ, 17-10-2021.

Disponível aqui

Não conseguiria abordar o tema do acesso feminino ao sacerdócio católico romano como assunto único. É tudo muito complexo, sistémico… e ultrapassa-me. Já julgo conseguir explicitar alguns pontos de vista se, a par do tema (e sem tabus) associar o estar em Igreja ou, melhor escrevendo, ser em Igreja. Vamos ao que interessa…

1 Não compreendo – e entendo até não conseguir adivinhar compreender no futuro – este fechamento

Os principais argumentos para eu não conseguir encontrar qualquer obstáculo plausível ao sacerdócio feminino residem em certa antropologia teológica. Neste jogo tensional entre a humanidade e Deus, só consigo vislumbrar uma redenção, uma revelação e uma ressurreição genuinamente universais. Deus é Pai por falta de palavras e conceitos melhores. Mas sabemos que é Mãe, também, e, em última análise, o vertimento amoroso divino não poderia ter peneiras de género. É claro que a realidade dos tempos em trânsito, a começar na força e superioridade anatómicas dos primeiros hominídeos machos, foi impondo uma assimetria, que ainda hoje combatemos. Mas é nos Evangelhos, sobretudo na forma como Jesus de Nazaré se abeira das mulheres (naquele tempo e naquele espaço, particularmente despromovidas) que baseio esta perceção de horizontalidade homem-mulher na proposta cristã, em todas as suas dimensões e, por isso mesmo, também na possibilidade de elas poderem animar e presidir à celebração da fé na eucaristia, bem como administrarem outros sacramentos e terem qualquer função, também estrutural e hierárquica, na Igreja Católica Romana.

Não é este o lugar para o escrutínio sistemático do ponto a que chegamos. Mas a teia argumentatória que abafa anda pelo facto de Jesus só ter tido discípulos mais chegados homens (o que é objetivamente discutível mas, mais relevante ainda, qualquer extrapolação histórica desta índole é ingénua). Ouve e lê-se, também, que para ‘cristificar’ (na eucaristia, por exemplo) teria que se ser homem, como Cristo… Mas um cristianismo profundo, me parece, reconhece o género masculino de Jesus como um “acidente antropológico”. Parece-me que há ainda um baseamento do sacerdócio excessivamente agregado ao sacerdócio milenar pré-cristão, o que não ajuda à emancipação que os nossos tempos demandam.

Há algumas pessoas que me acompanham, pelo menos em parte, no raciocínio interior, invocando, porém, que certa tradição não favorece caminhos de abertura. Eu julgo compreender o valor da tradição, a marca de novidade na continuidade com que se tece a Igreja e a própria proposta cristã. Mas tradição e fechamento, no meu entender, jogam mal. Se a tradição for para fechar e defender, superando a razão e os sinais dos tempos, não consigo acolher.

Tropeço também em argumentos de unidade católica, evidenciando a diferença entre as várias culturas e localidades onde a Igreja está implementada e onde o papel da mulher tem as mais variadas matizes. Compreendo essa diversidade, mas parece-me insuficiente para fechar o diálogo. Os embalos do Concílio Vaticano II (também ele, no meu entender, gérmen não explicito para outro papel feminino na Igreja…) fomentariam uma diversidade na unidade, capaz de dar aos Bispos, em leituras locais contextualizadas, ensaios de maior pendor feminino no seio da Igreja.

É bom clarificar que o facto de termos mulheres a poder presidir à eucaristia, por exemplo, traria mais oportunidades de muitos fiéis (e não é só na Amazónia…) terem acesso a esse sacramento tão fecundo de nos alimentarmos na Fé, para alimentarmos o mundo. Mas, se este artigo fosse um teorema, esta ampliação da oportunidade pastoral e sacramental seria só um corolário, em certo sentido, contingente, temporal e circunstancial. O(s) motivo(s) maior(s) é muito mais cristãmente essencial e amplo…

2- Assim como na ciência e religião…

O caminho que fiz até aqui, a este propósito, tem muito a ver com o diálogo ciência e religião. Parece distante, mas explico: sou um ignorante vindo do mundo das ciências. Talvez por ser químico (que é a ciência das misturas e é epistemologicamente uma disciplina que é muito quase-utilitarista de outras áreas do saber), li algumas coisas e falei com muita gente, principalmente do lado da teologia e da filosofia, para construir um edifício que me fosse coerente no que diz respeito à compatibilidade entre ciência e religião. Embora continuando (mais) ignorante, este exercício corrigiu-me em relação a alguns aspetos sobre a natureza da própria ciência, mas, mais importante ainda, devolveu-me como num bumerangue, resignificações religiosas. Baseei-me em gente ora mais, ora menos suspeita (Chardin, Rahner, Kung, Ratzinguer, Queiruga, Buber, Polkinghorne, Newman, Barbour, Vallina, etc). Nenhuma destas fontes me inspirou diretamente para uma fundamentação favorável ao sacerdócio feminino… mas (aqui está a nuance…) as bases que fui edificando para o exercício de tal compatibilidade entre ciência e religião, e que incluem a não ultrapassagem da razão pela fé, a não literalidade bíblica, o entendimento das Escrituras como livros de revelação e não de explicações, bem como a abertura do espírito e da mente para ler as evidências, entre outras, cairiam como castelos de cartas se fossem tecidas com argumentações congéneres, como as que escuto e leio para fundamentar o fechamento ao acesso sacerdotal das mulheres. A abertura que precisei aqui (ciência e religião) seria uma absoluto buraco negro, se eu usasse pressupostos da ordem dos que se me têm cruzado no contexto da problemática associada ao protagonismo feminino na Igreja Católica Romana… Dito ainda de outra forma: quando me é apresentado um argumento favorável ao fechamento das mulheres ao sacerdócio eu tendo quase sempre a poder elaborar que, se fosse ter tal tipo de condição em conta, no que diz respeito ao diálogo ciência-religião, rigidificaria a argumentação e acabaria num reduto onde não desejo estar: ciência e religião seriam incompatíveis.

3- Mas porque permaneces?

É sabido que, neste momento, na Igreja Católica Romana, o tema do acesso ao sacerdócio por mulheres é um não-tema, assumidamente encerrado para discussão. Na senda de João Paulo II, Bento XVI e agora Francisco (neste último caso, intuo, como preço de certa sinodalidade e não personalização do poder como serviço), o assunto está fechado… e nem sequer fechado para balanço… Tenho alguma repugnância intelectual pelos fechamentos intrínsecos. O terreno do exercício científico, que tem, no meu entender, sementes de judaico-cristianismo evidentes, habituou-me à abertura como forma de estar, ao estímulo crítico e à positiva provisoriedade das verdades científicas. Admito certos dogmas (certas boias) no que à fé diz respeito. “Deus é amor”, por exemplo, não é verdade que pretenda relativizar e destilar, mas tão só, em fé, acolher e viver. Só que “as mulheres não podem aceder ao sacerdócio” é de uma outra ordem e não merece, definitivamente, o selo de dogma inegociável, nem o estaticismo que a Igreja hierárquica lhe está a conferir… Em síntese, nesta reflexão, são duas, as setas críticas: a não abertura ao sacerdócio feminino e a opção de não abrir o diálogo interno sobre essa mesma circunstância.

Há pouco tempo, fui perguntado num grupo alargado de jovens sobre este assunto. Depois de exprimir o meu ponto de vista, alguém, percebendo o meu sentido crítico e até algum incómodo, perguntou-me porque permanecia na Igreja Católica, discordando deste (como de outros, acrescento eu) dinamismos ou bloqueios semelhantes. A crença vivida na comunhão, mais do que no poder e a prevalência da paz sobre a razão, como ouvi recentemente serem propósitos de alguém que celebrava a vida, inspiram-me à permanência…

Convém também clarificar que esta contenda tem um lado não essencial. Isto é, sem escamotear que os estado das coisas (no duplo sentido de fechamento antropológico e de fechamento dialogante) projeta, no meu entender, carências e incompletudes da Igreja, não é uma crucialidade do meu ser Cristão. Mais ainda, seria ingénuo pensar que, embora desejável, no que a mim diz respeito, mais abertura neste âmbito, resolveria as questões mais estruturais do cristianismo. Julgo que se eu fosse mulher, nada mudaria a respeito da colocação que acabo de expressar. Até porque tudo isto não se coloca a nível do ‘direito ao sacerdócio’, que é em si próprio uma antítese e uma enviesada porta de entrada. O que está em causa – que eu lamento como impossibilidade – seria um encontro para um serviço (nunca um direito). E todos os serviços se propõe e não impõe e muitas vezes é preciso esperar para que sejam acolhidos como uma possibilidade real. A essa espera me sujeito…

4- É sempre e só um ponto de vista, o (curto) meu…

Fica para outra abordagem um tema congénere no espaço público, o do acesso ao sacerdócio de homens casados. Aqui o tema é menos complexo e com facilidade dispensa a reflexão antropológica e teológica, conseguindo-se certa redução a um contexto de problema meramente disciplinar. Intuo que poderei morrer antes ainda da Igreja Católica Romana admitir no seu seio o sacerdócio de homens casados (não religiosos, o que é e será sempre um caso à parte). Mas não mulheres, muito menos mulheres casadas. Talvez não veja, pelo andar da carruagem, tal cenário vivo e implementado nestes anos mais em que poderei ter oportunidade de existir no planeta Terra. Admito e espero, contudo, ao menos, ver em crescendo a relevância da mulher na Igreja, incluindo, de forma óbvia e objetiva, nos seus centros decisórios de poder (de serviço pelo poder, melhor dizendo).

Importa-me ir refletindo o meu posicionamento em todo este dinamismo e os benefícios e prejuízos que o status quo sobre a matéria, neste momento específico da história da Igreja e do mundo, assinalam. Dou graças a Deus por poder expressar (-me), incluindo num meio de comunicação da Igreja católica (o Ponto SJ), de forma aberta e declarada. O que aqui escrevo, convicto mas ao mesmo tempo inseguro, é um imperativo de honestidade intelectual, que, nas minhas limitações, entendo radicado no Evangelho e nas portas universais que a Boa-Nova-de-todos-e-para-todos encerra. Mas é só um ponto de vista, é só a vista a partir de um certo ponto, o meu… Importa-me mais ‘o nosso’, que nem a força nem o poder imporão. Então faz-se caminho e eu aceito esse (lento) caminhar… A vida de fé é, em si mesma, uma espera paciente por um horizonte a que se aspira, que já se vislumbra, mas que ainda não se pode abarcar na totalidade. Se ser Igreja for um caminho comunitário de fé, como julgo ser, pede-me também esta paciência eclesial. No tempo que vivemos, posso até não me calar, e permaneço livre, alegre e pacientemente neste corpo de que quero tomar parte…

JP in Sem categoria 18 Outubro, 2021

«a Terra está cheia da bondade do Senhor»

Na liturgia católica romana deste fim de semana escuta-se o Salmo 32

«A Terra está cheia da bondade do Senhor»

Sermos capazes de ver e saborear as coisas boas é um elemento fundamental do nosso crescimento espiritual. Os Santos, em particular, são contemplativos, isto é, tentam ver com os olhos de Deus. Podemos olhar a nossa vida, os outros, a História, as situações e a Terra, salientando no que vemos “a bondade do Senhor”, conforme as palavras do Salmo. Não somos ingénuos e sabemos da existência do mal, dentro e fora de nós. Mas não conseguimos caminhar sem “atestar o depósito” da alegria, com a “bondade do Senhor”. Há uma palavra curiosa, neste contexto, que se pode convocar: a “abundancialidade” (da criação contínua…).

PS: Há uma linguagem própria das escrituras e da religiosidade, que pode precisar de resignificação. A expressão “Senhor”, por exemplo, pode ser encarada e vivida espiritualmente como um caminho de recentramento no que é essencial, num “qualquer coisa Outro” (O Senhor – amoroso), que não eu próprio…

JP in Espiritualidade Textos 16 Outubro, 2021