mulheres do nosso tempo
Escrevi a uma amiga, mulher deste século, com uma provocação: Cara professora-mãe-esposa-sensual-gestora de casa-cidadã-não-super-mulher…”
Escrevi a uma amiga, mulher deste século, com uma provocação: Cara professora-mãe-esposa-sensual-gestora de casa-cidadã-não-super-mulher…”
A carência, é, definitivamente, o fulcro e até a alavanca da fé (como pano de fundo, bem entendido, está a Graça). Trata-se de uma carência amparável, o que demonstra a própria vida, apelando a uma fé, assim, exequível…
Na liturgia católica romana deste fim de semana escuta-se Mt 13, 44-52
O Evangelho fala-nos de uma das parábolas do Reino dos Céus. Este reino é, neste sentido, uma pérola, um tesouro, que justifica que tudo vendamos para o ter. É curioso ter este olhar de pérola para com o próprio tempo: “vender tudo para ter o tesouro”, é tornar precioso cada minuto que experimentamos, seja de dor ou alegria, seja com esta ou aquela pessoa, seja de luz ou de escuridão. O que importa, é que seja vivido intensamente, como se nada mais houvesse do que esse mesmo minuto…
Há uma “pescadinha de rabo na boca” em que me sinto baralhado. Trata-se de gerir bem o tempo em que não sei gerir o tempo. Tantas vezes… Ocorre-me uma autoproibição (não me culpabilizar) e uma palavra de ordem (recomeçar).
Autoilusão consentida
Assumo esta
autoilusão
…consentida
até desesperada.
Daqui, da sede
calada que grita,
invento Alguém.
Corro
…como se fosse
real
esta mesma criação.
Vivo
…como se fosse
vida
a minha imaginação.
Avanço
…e num vazio pleno
sinto, experimento
e confirmo
que Alguém me abraça!
Quem diria:
o que inventei existia
… e era Graça!
Fornos, 20 de dezembro de 2017
Uma das inversões mais urgentes na prática religiosa cristã (que afeta significativamente a liturgia e as clássicas orações de petição) é a de assumir radicalmente que a graça é abundante e constante, que Deus “grita”! Vivemos numa atmosfera de graça (às vezes uma lufada, outras vezes mais abafado, mas sempre graça a respirar). Temos é dificuldade em reconhecer essa abundância, como o peixe não se reconhece molhado. E essa abertura e reconhecimento, essa mística de olhos abertos, importa pedir…
Se há assunto que poderia ser crónico e recorrente no nosso exame de consciência seria este: “hoje, houve muita palavra emitida e pouca escuta?…”
Na liturgia católica romana deste fim de semana escuta-se Rom 8, 26-27
Da carta aos Romanos fixamo-nos nesta constatação antiga, da dificuldade em rezar… De facto, se orar (ou rezar) for entendido como descansar em Deus, até aí é difícil rezar. Temos dificuldade em descansar, em geral… e em descansar em Deus, em particular. Daqui decorre que a primeira coisa para (tentar) rezar é, precisamente parar. Diz a mesma carta aos Romanos que o Espírito virá e essa é a promessa que alicerça a nossa fé. Mas para o Espírito nos alcançar, há que não fugir correndo…
Há ou não há?
Há ou não há
um vestígio de
eternidade no mar?
Há ou não há
Uns laivos de
Esperança na dor?
Há ou não há
Um pequeno
Cato verde no deserto?
Há ou não há
Um subtil
Milagre quando
Alguém nasce?
Há ou não há
Azul vindouro
No céu cinzento?
Há ou não há
Um sentido positivo
Para as misérias
Da história?
Há ou não há
Um traço de mistério
Nos bastidores da ciência.
Há ou não há
Um coração
Que bombeia
A mente não linear?
Há ou não há
Um caminho estreito
Na minha escuridão?
Há ou não há?…
Coimbra, 12 de Abril 2004
A fuga para a frente pode não ser a chave da boa morte. A (pseudo) fuga mais libertadora é precisamente a receção da vida como uma Graça, uma dádiva, uma promessa de que a fragilidade é a penúltima experiência. A isto se chama Fé.