poema sem nada para dizer
POEMA SEM NADA PARA DIZER
Até sem nada para dizer
se pode escrever um poema.
Como o silêncio fala
e o branco é cor.
Como sem forma há forma,
como sofrer é amor.
Como o curto é comprido
e o rejeitado é querido.
Como a morte é vida
e o detestado apetecido.
Como quem julga na alma
não ter nada para dizer.
Pega na tinta e papel
e acaba sempre por ter…
in Paiva, J. C. (2000), Este gesto de Ser (poesia), Edições Sagesse, Coimbra.
acessível aqui
sopram ventos
SOPRAM VENTOS
Sopram ventos
em imensas
direcções.
Ecoam vozes
de tons diferentes
em cada
linha do horizonte.
Forças várias
empurram-me
para muitos
sentidos.
A luz.
A cor.
A água
são o deserto
em que me encontro.
Não tenho tudo
mas sei o caminho.
Sei que depende
muito de mim…
in Paiva, J. C. (2000), Este gesto de Ser (poesia), Edições Sagesse, Coimbra.
acessível aqui
scaning da escuta
Scaning da escuta
Que os meus pés
Escutem o Teu chão
E minhas pernas
Caminhem a Tua voz.
Que as minhas entranhas
Respirem o Teu silêncio
E a minha boca
Diga a Tua presença.
Que os meus olhos
Alcancem a Tua sombra
E que eu cheire
O Teu perfume.
Que eu ouça
A Tua existência…
2015
mais uma Primavera
Mais uma primavera
Sim, gostava de
viver mais primaveras.
E ver as hortenses abrir
e o cheiro do pó…
Gostava de, mais uma vez
olhar os pitos nascer
e tocar neles pequenos,
de montar estruturas na horta
e colher morangos maduros.
Mais uma primavera,
para comer o cheiro das maçãs
e até espalhar o estrume na terra.
Quero mais uma primavera
para cortar lenha
e buscar paus e pinhas
para aquecer o inverno.
E mergulhar na piscina
quente e escura
a ver estrelas no céu.
E para partilhar com outros
estes privilégios,
uma primavera se pediria.
Mas o que eu quero mesmo
desejo e sigo,
emprestando vontade,
é colher a graça
desta Primavera,
talhada com a
sacralidade
do instante
em que escrevo.
O dom da esperança
me basta
… a ele,
me rendo amorosamente.
Fornos, 11 de fevereiro de 2015