carências de abertura
A fé é um apoio vivente na convicção de que a carência, a dor, o desassossego, a inquietude, a incompletude e a morte, podem gerar abertura ao Espírito…
A fé é um apoio vivente na convicção de que a carência, a dor, o desassossego, a inquietude, a incompletude e a morte, podem gerar abertura ao Espírito…
Pedir a Deus não é relembrar Deus – que sabe o que preciso, eu e a humanidade. Pedir a Deus é expor-me à graça, a partir da minha abertura, do meu desejo e da minha carência…
Talvez no Paraíso, apenas aí, se encontrem duas realidades humano-divinas, essenciais e paradoxais, que só em aperitivo ensaiamos, nesta vida, no seu conjunto: destino (amoroso) e liberdade…
Reconheço uma queda, senão mesmo um vício, que se manifesta por espreitar(forçar?) a coisa metafísica. Alguém me dizia: “é fascinante tatear porque os primeiros exemplares homo apareceram aqui (naquela zona de África)…”. Pensei para comigo: removemos uma simples palavra de quatro letras e a afirmação vira metafísica: “é fascinante tatear porque os primeiros exemplares homo apareceram”…
Se me perguntassem de que fios é feita a minha fé, escolheria três: a graça (prévia), a necessidade e o desejo.
Na senda das sugestões de Thomas Halik em ‘Paciência com Deus’, diante da incompletude e de muitos esmagamentos que nos sufocam, temos quatro grandes filões de resposta: 1- desespero e depressão; 2- adaptacionismo interesseiro (em Roma sê romano…); 3- droga-te (com várias coisas como droga, dinheiro, religião e outras coisas em dose alienante); 4 – fé. Isto é, perseverar pacientemente na crença vivida de que há um sentido.
Conta-se a história de um monge budista jovem que, julgando-se já iluminado, parte para longe e afasta-se da zona da sua formação. Voltando anos depois, vai ao encontro do mestre. Face a ele, o jovem vê-se confrontado com uma pergunta simples: “em que posição deixaste as tuas sandálias?”. O jovem não se lembrava e o mestre disse então: “não alcançaste iluminação”. Faltava ao jovem o que nos falta a todos: atenção simples.
Apesar da independência que ciência e religião devem ter, há movimentos de interpenetração curiosos. Aprecio os insights que as teorias científicas da evolução podem oferecer à teologia. Por exemplo, a Santíssima Trindade como triangulação de movimento evolutivo, a cristologia a olhar Jesus em evolução ou a própria dogmática como movimento evolutivo. Um Deus que está em acontecimento…
Há propósitos que tenho há muito tempo e que tenho dificuldade em praticar. Um deles é este, bastante simples: esperar que o outro pergunte… Quando me distraio, não cumpro este propósito e estou a responder antes de me perguntarem…
Na liturgia católica romana deste fim de semana escuta-se Lc 9, 18-24
«tome a sua cruz todos os dias e siga-Me»
Tomar a nossa cruz, ao jeito cristão, tem o seu quê de rendição e, em certo sentido, de entusiasmo. O Evangelho é sistémico e, noutras passagens, esta mesma cruz pode relacionar-se com um ‘jugo leve’ e uma companhia mansa. A cruz e o seu carrego, com mais ou menos religiosidade e simbolismo, é uma evidência antropológica que se impõe além da fé. A vida não é fácil e essa é uma constatação que não carece de fé. Os que acreditam, porém, poderão ser originais na forma como carregam a sua cruz. Nessa originalidade, pela esperança numa vida vivida que vive sempre, os Cristãos tentam seguir Jesus no estilo lutador mas aceitador, frágil mas fiel.
Nota: Este texto é reutilizado/adaptado a partir de um post já publicado neste blog
L1: Zac 12, 10-11; 13,1; Sal 62 (63), 2. 3-4. 5-6. 8-9
L2: Gal 3, 26-29
Ev: Lc 9, 18-24