pobreza e Alegria

Este Papa, que não por acaso se chama Francisco, investe numa Igreja dirigida aos pobres. Escreve uma primeira encíclica sobre a Alegria, como que dizendo que a “mola” que nos pode mover a tocar as chagas do mundo é, precisamente, a Alegria… Entenda-se: a pobreza toca, entristece e até esmaga. Mas o seu combate carece de um Encontro prévio com uma esperança que se pode sintetizar na Alegria interior…

JP in Frases 26 Março, 2020

Açambarcamento digital…

Artigo no Jornal Observador em 22 de março de 2020, que pode aceder aqui.

Covid19 e estrangulamento das vias digitais: é urgente sensibilização, campanhas e normas para o teletrabalho 

Se as crises são oportunidades, a otimização dos procedimentos digitais é uma delas. O seu uso com critério salvará a sua causa. O seu abuso descontrolado e desregulado, arruinará as suas promessas!

Nesta crise que nos pode fazer crescer, pessoal e civilizacionalmente, começamos a ter algum tempo para nos dedicarmos, seletivamente, a problemas novos sem receita, de hoje e de amanhã.

Fruto de alguma reflexão, mas principalmente da experiência quotidiana, começam a emergir agudos problemas com a largura de banda e são óbvios os estrangulamentos de sinal.

Na Universidade do Porto, onde leciono, estão a ser implementados de forma massificada estilos de aprendizagem mediados digitalmente. Há alguns anos que a nossa universidade vem apostando no que genericamente se designa por e-learning e é impressionante notar a prontidão com que a nossa instituição promoveu os meios e a formação dos docentes, a este nível. Hoje mesmo fomos confrontados com a possibilidade legal de realizar provas de mestrado e doutoramento on-line, o que será ótimo para darmos continuidade à nossa docência e atenuarmos os danos deste retiro forçado. Na segunda-feira próxima, em particular, começarão de forma ainda mais acentuada as aulas on line.

Em paralelo sei bem que outras universidades e todas as escolas de todos os níveis de ensino se preparam para generalizar o ensino-aprendizagem à distância. Outras instituições, em dinamismos de teletrabalho, estão mais ou menos em prontidão para prestar muitos serviços.

Há muitos constrangimentos associados a este desafio, desde a formação dos docentes à reatividade de alguns aprendentes, passando por eventuais injustiças devido a grande variabilidade e democraticidade dos acessos a recursos. Mas intuo que será outro o problema principal, precisamente o estrangulamento da internet.

Podemos e devemos antecipar-nos e, em paralelo e por vários caminhos, criar condições de priorizar para “servir serviços”, todos os dinamismos digitais, no horário de expediente das 9h às 18, em dias úteis:

  1. Apesar da dificuldade técnica de verificar a sua implementação, decretar a proibição de acesso por via digital, dentro do horário de expediente determinado, a plataformas lúdicas que incluam práticas como download de filmes, jogos, redes sociais de comunicação com ficheiros pesados, etc..
  2. Pedir a algumas empresas que ajudem técnica e comunicacionalmente neste desiderato (a Netflix e outras plataformas congéneres já estão a baixar a resolução de alguns recursos mas é tudo ainda muito insuficiente).
  3. Implementar campanhas publicitárias de promoção desta causa. Poderiam seguir um slogan do tipo “liberta a rede para servir” e ter até algum dramatismo em algumas frentes comunicacionais (por exemplo, “enquanto fazes o download de um filme, falha a comunicação digital num hospital e perde-se uma vida”).
  4. Valorizar e incentivar as pessoas a procurarem momentos lúdicos com recursos ora mais clássicos (como jogos de tabuleiro ou livros) ora off line (DVDs, discos duros locais, etc)
  5. Outras medidas técnicas de gestão de redes que consigam mitigar esta problemática.

Sem estas e outras medidas haverá, com toda a certeza, a fragilização decepcionante de uma potencialidade enorme oferecida pela mediação digital nas suas virtudes de atenuar os impactos desta crise e até de promover práticas mais humanizantes, com enorme futuro. Se as crises são oportunidades, a otimização dos procedimentos digitais é uma delas. O seu uso com critério salvará a sua causa. O seu abuso descontrolado e desregulado, arruinará as suas promessas!

JP in Sem categoria 24 Março, 2020

habitarei para sempre na casa do Senhor

Na liturgia católica romana deste fim de semana escuta-se Slm 22

«habitarei para sempre na casa do Senhor»

«Habitarei para sempre na casa do Senhor», proclama o refrão do 
salmo. Este convite à fidelidade (para sempre) é dos dons mais preciosos da fé. O compromisso, a fidelidade e o ‘para sempre’ podem soar a monótono e a ‘sem aventura’. Ser fiel, porém, pode ser um permanecer que conduz a saborear terrenos de abundância. As tensões paradoxais em que vivemos (e que somos!) conduzem-nos a uma possibilidade dos extremos se tocarem. Um desses jogos dicotómicos acontece com a liberdade e com o compromisso. E se ‘ficar para sempre’ fosse uma abertura? E se a obediência fosse uma liberdade?…

JP in Espiritualidade Frases 22 Março, 2020

Terra assumida

Terra assumida

O Céu que quer

desabrochar em nós

exige Terra assumida:

árida e fecunda,

ampla e de grãos,

livre e pisada.

É a Terra que somos…

JP in Poemas

Regras para ordenar-se face às notícias sobre a COVID-19

J. C. Paiva, Regras para ordenar-se face às notícias sobre a COVID-19 Site PontoSJ (que se recomenda…). 18 de março de 2020.

Disponível aqui

Oito regras claras que nos ajudam a não perder nem o norte, nem o critério enquanto navegamos na imensidão das notícias.

Estar informado é um bem potencial. Mas, na bonança como na tempestade, na crise mais aguda como na crise contínua da vida, importa ter critério e usar da informação tanto quanto nos conduz à finalidade para a qual estamos amorosamente a ser criados.
Apresentamos um conjunto de regras/sugestões, na esperança de ajudar. Compreendemos as tentações de excesso, também por nós vividas. Por isso alinhamos, antes de mais para nós mesmos, umas dicas orientadoras. Para que as notícias, sendo água, não nos inundem nem afoguem, mas nos reguem moderadamente, para dar fruto sobre a realidade que vivemos:

1- A dose importa
Todos nós, nestes tempos conturbados, tendemos a abusar da dose noticiosa. É compreensível mas é duvidoso querer saber tudo e a toda a hora. Esta ânsia pelas últimas notícias desfoca-nos da atenção à realidade presente, do tempo necessário para saborear, refletir e integrar.
Valerá a pena planear os tempos de recepção de notícias e ser fiel a esse propósito. Por exemplo, talvez baste um e apenas um telejornal por dia, uma leitura de um ou outro artigo de opinião, se possível em horas pré-determinadas. Que tal uma leitura de artigos de manhã (depois e não durante o pequeno almoço, desejavelmente a seguir a um momento meditativo/orante) e o telejornal das 20h ou das 21h, apenas?

2- As fontes importam
Preferível jornais de referência e televisões menos bombásticas. A título de exemplo, têm merecido incontestável consideração o Jornal Público e o telejornal da SIC. Estas fontes já selecionam, por sua vez, fontes cientificamente credíveis e peritos bem colocados. Fazem um trabalho de seleção noticiosa de várias amplitudes e sensibilidades. Seria uma tentação sermos nós a filtrar a informação e, se nos aventurarmos a fazê-lo, arriscamo-nos a uma imersão pouco respiradora.
Embora possa parecer um pouco rígido, talvez valha a pena optar por não valorizar as redes sociais como fonte de notícias. Aí, ao contrário, o filtro e o critério são absolutamente erráticos…

3- E se as redes sociais fossem só para ajudar?
Será excessivo pedir a quem se move muito nas redes sociais para as abandonar neste tempo (ainda que alguns possam entender por bem essa defensividade radical), mas sugere-se que estas redes tenham filtro receptivo e de emissão. Que se escute, leia, veja e valorize apenas o que leve a um bem maior. Que se ‘post’ apenas o que puder ajudar (eventos difundidos no ponto sj ou campanhas de solidariedade credíveis, por exemplo).

4- O que é importante e o que é menos importante
Há uma ‘auto-cusquisse’ endémica que nos ataca a todos nestes momentos. Tantas vezes nos deixamos enganar e valorizamos equivalentemente o que tem importâncias muito diferentes. Mais ainda, convém ativarmos uma espécie de lupa sensível para as boas notícias e sermos capazes de procurar e depois valorizar interiormente as boas notícias: os esforços heroicos, as procuras de essencialidade, as expressões de solidariedade, os pretextos de reflexão global e melhoria pessoal e coletiva.

5- Levar as notícias à oração
Para um crente, Deus não mete férias nem entra em crise. A afirmação da fé vivida é precisamente a de um Deus connosco, que caminha e nos solicita a ser as Suas próprias mãos. Levar as notícias à oração confunde-se com levar as notícias à vida. Podemos ensaiar a esperança e a confiança, lembrar os outros sofrentes e, principalmente, diante de cada notícia que fez eco em mim, pedir a confiança da solidez e oferecer a fragilidade e a força de que somos tecidos para aliviar vários jugos.

6- Não deixar de ter acesso a outras notícias, a outras leituras e a outras visualizações
Não esquecer de ler outras notícias, visualizar outros filmes, descansar em tantos livros, assistir a outros debates e escutar tantas outras melodias. O ponto sj, em particular, está a organizar-se para interessantíssimas ofertas.

7- O silêncio traz boas notícias
Um apelo à paragem, ao silêncio e à meditação. Nem no rebuliço do stress quotidiano nem nas crises mais agudas se torna óbvio o apelo ao silêncio e à meditação. Porem, quer ali quer aqui, nada há mais urgente e fecundo do que algum silêncio de encontro. Desse silêncio, desejado, praticado, disciplinado (e, porventura, apenas muito depois, gozado) sopram sempre boas novas…

8- Estar atento, com critério e com defesas, é um estado de vida
Há um estado ontológico, próprio do ser humano e particularmente da existencialidade crente, que norteia todo o critério, também o da filtragem noticiosa, hoje e sempre: cada crise é um desafio, cada ferida é uma potencial bênção, cada acontecimento, cada notícia, pode ser integrável, levar ao todo e ao Tudo do ser… e fazer crescer! Neste sentido, o ambiente vivido na crise do coronavírus é “só” uma vivência mais concentrada da esperança que nos apoia e nos liberta, todos os dias e em todas as circunstâncias. Tal intensidade é bom pretexto de arrumação da casa, exterior e interior. Que as notícias, no modo certeiro de as autogerir, nos ajudem nesta limpeza…

JP in Sem categoria 20 Março, 2020

tentação, escravidão e liberdade

Mesmo sem carregar na duvidosa concupiscência ou em dicotomias esbatíveis como corpo-alma ou terra-céu, a tentação está aí na nossa vida, devendo merecer a nossa atenção, sobretudo interior. A tentação tem potencial de crescimento e é uma corda bamba cujos pólos são a escravidão e a liberdade…

JP in Espiritualidade Frases 18 Março, 2020

As casas para arrumar…

Diante de crises como a do coronavirus agudizam-se provocações existenciais e práticas que, em todo o caso, são típicas da nossa vida: face a uma realidade, por mais adversa que seja, o melhor é sempre render-nos e, criativamente, tentar crescer. No presente caso valha-nos o tempo que o tempo nos vai dar para arrumar as nossas casas, as de dentro e as de fora… Boas arrumações!

JP in Frases 16 Março, 2020

se hoje ouvirdes a voz do Senhor não fecheis os vossos corações

Na liturgia católica romana deste fim de semana escuta-se  Slm 94

«se hoje ouvirdes a voz do Senhor não fecheis os vossos corações»

O pecado (o ‘tiro’ menos certeiro) inqiueta-nos. O afastamento do amor não nos traz paz ao coração. As palavras do salmo apelam à abertura dos nossos corações, ao rasgar de espaços interiores para ao amor de Deus. Santo Agostinho exprime de forma belíssima o confronto entre a sede de infinito e a abertura a Deus. Diz ele: “Tu, Deus, fizeste o meu coração para Ti e o meu coração não terá paz se não repousar em ti”. Confrontados com os nossos limites, com os limites dos outros, com os limites do mundo, valerá a pena repousar a nossa inquietude em Deus…

JP in Espiritualidade Frases 14 Março, 2020

bem e mal apreendidos…

O filósofo Xavier Zubiri afirma que a realidade em si está para além do bem e do mal. É só na apreensão humana que bem e mal ganham critério. É curioso ampliar esta abordagem a realidades como o amor, a beleza e a própria revelação divina: sim, há uma doação prévia de “Algures”, mas é a captação humana que é convocada. Quem nos cria quis “precisar” de nós…

JP in Frases 12 Março, 2020

ciências cognitivas e teologia

As ciências cognitivas lançam novos desafios à compreensão do ser humano e da sua experiência religiosa, com base no estudo do cérebro e da mente. A teologia só tem a ganhar se levar a sério os novos dados que lhe vêm da ciência. Os teólogos não se poderão limitar a achar interessantes as teorias científicas, como se não tivessem de as estudar e levar a sério enquanto teólogos. A teologia deve retirar das teorias científicas fundamentadas as implicações que introduzam modificações no próprio discurso teológico e na compreensão que o cristianismo tem de si mesmo. De outra forma, os teólogos poderão estar a fazer um discurso cada vez mais irrelevante e a criar conflitos desnecessários com a ciência em particular e com a cultura, em geral. Depois, convém sempre sublinhar, teologia não é Fé. A tudo falta uma pitada de vivibilidade…

JP in Ciência Espiritualidade 10 Março, 2020