Praia de Mira

PRAIA DE MIRA

O farnel

está protegido

na sombra

constante

da barraca.

A maioria

está vestida

e, arregaçando-se

lança a aventura

de molhar os pés.

Alguns homens

trazem marcado

no corpo nu

as alças brancas

do trabalho.

Quantas mulheres

com lenços escuros

destacando rostos

de simplicidade.

Mas o mais belo

desta tarde

foi ver sentido

naquilo que,

outrora, míope,

chamei parolos…

…in Paiva, J. C. (2000), Este gesto de Ser (poesia), Edições Sagesse, Coimbra.

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JP in Poemas 2 Julho, 2018

A ti que sofres

A TI QUE SOFRES

A ti

que sofres

não te peço que

não chores.

Que não chore

não há quem.

Que chores,

não te peço

também.

Peço-te…

que chores…

bem!

…in Paiva, J. C. (2000), Este gesto de Ser (poesia), Edições Sagesse, Coimbra.

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JP in Poemas 30 Junho, 2018

Queima da fitas

QUEIMA DAS FITAS

Chegaram

cheios de momentos.

Mortos de cansaço.

Despejaram a vontade

no prazer do tempo.

Bufavam fraquezas

de alma vazia.

Não esperaram

por mais

qualificada gratificação.

Verteram na

cerveja

golos de solidão.

Entornados,

abraçavam

o vazio.

in Paiva, J. C. (2000), Este gesto de Ser (poesia), Edições Sagesse, Coimbra.

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JP in Poemas

O que são as borboletas

O QUE SÃO AS BORBOLETAS?

As borboletas

são papéis

de cores vivas.

São pétalas

voadoras

disfarçadas

de asas coloridas.

As borboletas

são retalhos

de arco-íris,

pedaços de beleza,

fragmentos

do sorriso

de Deus!

in Paiva, J. C. (2000), Este gesto de Ser (poesia), Edições Sagesse, Coimbra.

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Comboio da CP

COMBOIO DA CP

Num comboio sujo

da CP

não fujo

do que se vê.

Antes tento

contemplar

neste assento

por lavar.

Um magala

mal criado.

Um emigrante

exaltado.

Um idoso

orgulhoso

do desconto.

Uma criança

que cansa

de ser chata.

Mas dos

bancos

vêem-se

campos.

Seria mesmo uma pena

se no meio de tantas cores

não visse em cada cena

uma só daquelas flores.

in Paiva, J. C. (2000), Este gesto de Ser (poesia), Edições Sagesse, Coimbra.

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JP in Poemas

Professor

PROFESSOR

Intui o professor

numa aula preparada:

viu um singelo escultor

face à obra, quase nada.

Mas o que mais o espantou

quando a aula virou vida

foi sentir que não criou

e que foi obra esculpida!

in Paiva, J. C. (2000), Este gesto de Ser (poesia), Edições Sagesse, Coimbra.

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JP in Poemas

Agarrando o dia

AGARRANDO O DIA

Quase me escapava,

este dia igual.

Quase parecia

o bisar da repetição

mas não!

Fica quanto amei

e tantas coisas

que aprendi.

O que fiz bem,

o que falhei.

Tudo foi

bom para mim.

Um dia

… é um trampolim.

in Paiva, J. C. (2000), Este gesto de Ser (poesia), Edições Sagesse, Coimbra.

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JP in Poemas

poeta morto

POETA MORTO

Criou-se

um espaço de silêncio.

Secou a veia

e morreu

a inspiração.

O poeta escondeu-se

por falta de poesia.

Sem coisas para cantar

… ele quis escrever.

… sem respirar!

in Paiva, J. C. (2000), Este gesto de Ser (poesia), Edições Sagesse, Coimbra.

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JP in Poemas

Gritar solidão

GRITAR SOLIDÃO

Grito daqui,

do antro

da solidão!

Grito os sonhos

perdidos,

despido

da história

que vi gravada

no tempo!

Grito saudade,

grito silêncio!

Grito baixinho.

Fixo-me

naquela esperança

que me esconde

o abismo

que não existe!

in Paiva, J. C. (2000), Este gesto de Ser (poesia), Edições Sagesse, Coimbra.

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JP in Poemas

Vou partir

VOU PARTIR

Fecho as portas

da casa

em que gostaria

de viver.

Venho-me embora

do local

que parecia

feito para mim.

Saio!

Não tenho

a certeza

de poder permanecer.

O mundo não é

este país,

vou partir!

in Paiva, J. C. (2000), Este gesto de Ser (poesia), Edições Sagesse, Coimbra.

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JP in Poemas